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Poética da Urbanidade - Estudos interculturais
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Dresden
Materiais para as discussões do Colóquio Internacional de Estudos Interculturais (2004)

 

DRESDEN-SÃO PAULO NO PROGRAMA DE ESTUDOS INTERCULTURAIS "POÉTICA DA URBANIDADE" PELOS 450 ANOS DE SÃO PAULO

PROBLEMAS DA VALORIZAÇÃO ESTÉTICO-CULTURAL DO PASSADO
Dresden, 11 a 12 de julho de 2003

Súmula

 

O despertar de novo interesse pela história e pela contextualização histórica de espaços degradados e fragmentados de cidades leva, naturalmente, à questão da valorização estético-cultural das diferentes épocas representadas no panorama urbano.

Dresden está presente na discussão arquitetônica e urbanística do presente sobretudo devido à reconstrução de uma de suas monumentais igrejas (Frauenkirche), uma obra de extraordinários custos e exigências técnico-artísticas, para a qual foi encetada uma grande campanha nacional de arrecadação de fundos. Nesses esforços manifesta-se uma certa tendência restaurativa e historicista na atualidade. Os argumentos favoráveis à reconstrução desse edifício religioso são muitos, sobretudo, porém, de cunho urbanístico. Dresden, cidade profundamente marcada pelo Barroco, tinha, de fato, antes da sua destruição em fins da Segunda Grande Guerra, nessa igreja um de seus edifícios mais caracterizadores e valiosos.

Paralelamente a esses esforços reconstrutivos, constata-se um certo descuido relativamente à herança arquitetonica e urbanística do passado presente, ou seja, da época da superada República Democrática Alemã (DDR). Essa desvalorização, porém, parece ser míope, pois pode-se partir do princípio que, dentro do rítmo das gerações, esses projetos dos anos 60 e 70 passarão a ser revalorizados em futuro não muito distante.

Um dos principais projetos socialistas de urbanização da antiga DDR foi o da Rua de Praga. O concurso para a remodelação dessa rua realizou-se no ano de 1962. Segundo os planos de Peter Sniegon, Kurt Röthig e Hans Konrad, o projeto foi realizado entre 1965 e 1970. A antiga rua foi consideravelmente alargada e transformada numa ampla zona de pedestres. O espaço da área é delimitado por um grande edifício que, paralelamente à rua, funciona como monumental parede. Defronte a ele, edifícios situados transversalmente com relação à rua equilibram e harmonizam o espaço. Defronte ao edifício de moradias, paralelo à rua, construiram-se construções planas e baixas, assim como entre as demais edificações.

O intuito do projeto é claramente perceptível e compreensível: arejamento, claridade, ordenação funcional e elegância proveniente da própria forma. Com hotéis para turistas, restaurantes e lojas, esse projeto da Rua Praga representa um modêlo das concepções de urbanidade do socialismo, claramente inseridas em tradição da modernidade. Ele pode ser comparado com a Lijnbaan de Rotterdam, projetada por van den Broeck e Bakema, entre 1949 e 1953, e com certas soluções urbanísticas de Brasília e também de São Paulo. A discussão a respeito do atual estado de espírito de desapreço com relação a esse tipo de concepção urbana e de urbanidade é, assim, de atualidade para debates relativos às ciências da cultura em contextos urbanos euro-brasileiros.

O pesquisador Thomas Topfstedt levantou os problemas resultantes dessa desconsideração dos projetos arquitetônicos de países socialistas dos anos sessenta e setenta. Para ele, esse desapreço é produto de um preconceito. Supõe-se que a arquitetura dessa época possuiria apenas um significado utilitário, uma vez que inexistia o arquiteto como profissional liberal. Ao contrário, porém, Th. Topfstedt salienta as qualidades e a diversidade tipológica da arquitetura da antiga DDR.

Devido às dificuldades econômicas e sobretudo à continuidade de utilização garantida pela ideologia, essas construções foram conservadas no seu estado original. Hoje, porém, passam a ser destruídas e substituídas por edifícios e outras soluções arquitetônicas às vezes de muito menor interesse estético e social. As administrações públicas e os novos proprietários partem do princípio de que toda a antiga arquitetura da época socialista reduz-se a construções sem maior valor cultural. Se esse processo não for controlado, logo já não haverá monumentos da arquitetura da época da República Democrática Alemã.

Essas construções e soluções arquitetônicas, porém, representam uma fase significativa da história do urbanismo do século XX. Ao contrário dos princípios stalinistas, que apregoavam a continuidade de impulsos classicistas e nacionais na arquitetura, houve, a partir de 1955, uma reorientação clara de projetos segundo tendências internacionais na tradição modernista. Nos "16 Fundamentos da Construção Urbana", o partido e o govêrno tinham fixado que a cidade deveria ser "democrática segundo o seu conteúdo e nacional quanto à forma", assimilando as "experiências do povo corporificadas em tradições progressistas do passado". Após a conferência de Moscou de dezembro de 1954, novos caminhos foram seguidos. A preocupação básica foi de cunho racional, sobretudo a de construir rapidamente e de forma a mais econômica possível. Esse intuito levou à procura de soluções racionalizantes e à estandartização tipológica condicionada por processos industriais. A partir dessa época, estabeleceu-se um singular intercâmbio entre construtores e arquitetos do Leste e do Ocidente.

Antonio Alexandre Bispo

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